quarta-feira, 23 de abril de 2008

Política e discurso político

O espaço social é constituído pela diferenciação social. E mesmo o espaço da democracia moderna, ao oferecer igualdades de natureza formal, é constituído pela diferenciação. Pois o discurso político é fundado no princípio de autoridade; princípio que supõe a capacidade de se exercer uma atividade. Algumas vezes essa autoridade precisa ser sancionada por uma instituição, como o conselho de medica ou engenharia. Não é o caso da (re)produção de discursos políticos. Mas a falta de controle institucional só permite que o sistemas de controle sobre a emissão de discursos políticos seja mais intenso porque sub-reptício. A democracia formal, ao abrir espaço à opinião e manifestação popular, não assegura que todos os indivíduos se sintam confortáveis para opinar e debater questões políticas. Pois a prática do discurso político necessita do domínio de ferramentas que lhe sejam compatíveis: instrução, conhecimento fatos do cotidiano, domínio de esquemas classificatórios dos atos políticos e assim por diante. Não se diz que um homem de pouca instrução não possa se envolver em na arena política por meio de discussões de cunho político. Todavia os indivíduos despossuídos de ferramentas (capital cultural e escolar) possivelmente não intervirão de modo semelhante àqueles que estão mais “habilitados” ao manuseio das questões políticas. Aos mais desfavorecidos de instrução e cultura muitas vezes só resta a revolta moralista.

Se a falta de ferramentas impede parcialmente o indivíduo de se inserir no espaço de debates políticos, a posse de tais ferramentas assegura apenas uma inserção socialmente legítima, não dizendo nada sobre a capacidade de ação crítica. Os indivíduos que se arriscam a debater assuntos políticos correm o risco de se verem hipnotizados pelos efeitos auto-indulgentes da aquisição de capitais passíveis de serem transmutados em ação e discurso político.A posse de capitais sem dúvida possibilita que o indivíduo possa agir legitimamente do ponto de vista social. Mas a simples posse de capitais nunca gerará a possibilidade de crítica e discussão racional. E a chance de se produzir meros improvisos sobre os mesmos temas se torna um perigo constante.

Os intelectuais geralmente são muito solícitos quando são convidados a participar em debates políticos. Mas se os intelectuais têm uma função importante na democracia brasileira, em minha opinião, seria a de depurar os espaços do debate político. Desse modo, se colocaria a seguinte pergunta a todos os indivíduos preocupados com questões políticas e intelectuais: como podem transmutar seus capitais (escolares e culturais) em capital político, ou seja, como podem agir política mas também racionalmente sobre as discussões políticas?

Um comentário:

Anônimo disse...

A reflexão me parece muito oportuna para pensar o proposito mesmo desse blogue que se inicia. Qual o papel reflexivo e politico de um blogue formado por doutorando em ciências sociais? Eu acredito que poderiamos, primeiramente, formalizar algumas opiniões sobre "o que realmente fazemos" nas nossas respectivas pesquisas. Não num exercicio acadêmico, mas num esforço de entender o que nossas praticas intelectuais significam... Temos a voz que pensamos ter? Temos as ferramentas que pensamos ter, os capitais? Como cada um de nos pensa essa relação entre a ciência social e nosso lugar no mundo social, entre o cientista e o politico? Talvez, ao menos nesse periodo de teste, o blogue possa servir de espaço para refletir essas coisas também.