quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Texto da apresentação (defesa)

Eu gostaria de começar essa apresentação agradecendo a presença de todos vocês. Dos integrantes da mesa, a professora dr. e minha orientadora Lília Junqueira, o professor dr. Sérgio Miceli, o professor dr. Alfredo Cesar, o professor dr. Luciano Oliveira e o professor dr. Paulo Marcondes, às pessoas do público, minha família e amigos e os demais que prestigiam essa defesa de doutorado.

Leio esse texto que escrevi em momento de tranquilidade. Na verdade, era grande o meu medo de a emoção me impedir de fazer uma apresentação clara e inteligível. Por essa razão, decidi ler calmamente algo que traduzisse também meu receio, imaginando que a situação de avaliação poderia trazer à tona lembranças fortes de uma trajetória intelectual improvável, agora podendo ser inciciada, testada e avaliada diante dos trâmites oficiais da instituição universitária, sob o olhar rigoroso e crítico dos pares que formam esta banca. Gostaria de agradecer desde já a leitura antenta e cuidadosa que sei todos vocês fizeram do meu trabalho.

Não sei o quanto do meu nervosismo decorre de outro elemento. Do fato de eu ter consciência de haver na sociologia a qual pratiquei uma recusa à parte do mundo que escolhi para fazer parte. Para utilizar as palavras que Antonio Candido usou para falar da tese de Sérgio Miceli, a recusa em aceitar de maneira passiva fazer parte da "grande família dos intelectuais". Tavez venha daí a sensação desconfortável de estar traindo a quem eu gostaria de ver reconhecendo a qualidade de meu trabalho. Na medida que, aqui e acolá, durante a feitura da tese, confrontava-me com questões descritivas como o que é que chamamos de sociologia da literatura, ou, de maneira mais geral, com pergutas do tipo o que é fazer sociologia, sem usar definições fixas nem de manuais, captando, porém, aquilo que a tradição considera como sociologia da literatura; ao usar também os preceitos da própria sociologia para confrontá-los aos procedimentos mais corriqueiros da crítica literária(tidos por muitos como única forma de fazer boa sociologia da literatura), foi ao me confrontar com tudo isso que ia percebendo com mais clareza que o que estava em jogo era mesmo a capacidade reflexiva da sociologia de se afirmar como disciplina científica. E a minha, é claro, de me afirmar como sociólogo da maneira que eu gostaria de ser visto e reconhecido. Dizer que os intelectuais, grupos do qual se subentente que o sociólogo faça parte, obedece as mesmas lógicas sociais de fucionamento que de outros agentes sociais, gera sempre desconforto a aqueles que, por uma ou outra razão, fizeram da atividade intelectual (que é sempre reificada e encantada pela ignorância que temos a respeito da sua condição social de produção) um recanto conformado e conformista, lugar em que o que se quer preservar é a posição social que é assegurada pelo próprio estatuto de intelectual. Meu desconforto era uma evidência de que tal lógica também estava presente comigo no decorrer de meu trabalho.

O mais importante do meu trabalho, porém, esteja talvez nas entrelinhas: falar de sociologia dos intelectuais é algo de fato muito genérico. Minha tese mostra que é preciso articular ferramentas de várias sociologias específicas, associar a sociologia da cultura e dos intelectuais, por exemplo, à sociologia do trabalho, através da ideia de condições de trabalho intelectual. Isso se quisermos de fato fazer uma sociologia da literatura e dos intelectuais que preze pela vida concretas desses agentes. Isso é necessário porque a categoria intelectual é tão ampla e abrangente que oculta nela os elementos sociais de identificação das formas de agir dos próprios intelectuais. Falar de Graciliano Ramos como escritor, o que diabos quer dizer isso? Como e de que vive um escritor? Eis pergunta que ajuda a materializar o intelectual e me levaram a procurar responder coisas a respeito da vida e da obra do Velho Graça. Na minha cabeça a sociologia tem um papel fundamental ao tentar responder esse tipo de questão, inclusive como forma de enquadramento do seu próprio potencial reflexivo.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Carta aberta

Daqui ouço esse zun zun zun de vocês pensando:
acertando idéias, ajustando caminhos, praticando insights, ensaiando acertos:
maquinaria de achados, grafos demarcados, apagados e remarcados
em longas e tortuosas vielas de mapas por se fazer: cada um.

Daqui, da rua Aníbal Falcão, 116, Graças, ouço cada um de vocês e os seus escaninhos desempoeirados,
os grafites roçando notas, as esferográficas rolando aquela bolinha de tinta em papéis brancos;
ouço o toc toc dos teclados, o sinuoso cruzar de pernas às tardes
sob a plataforma de madeira onde arqueijam cotovelos machucados.

Daqui, deste meu birô que comprei na rua da Conceição faz já meia década
imagino o pontiagudo roçar do ponteiro dos segundos declinando oitavas
infinitesimalmente iguais nos nossos escritórios.
Somente o suor nos é diferente.

Daqui, uma periclitante vontade de abraçá-los
tomar um café no final de tarde
pra saber com calma quem são mesmo vocês
de quem eu sinto essa imensa saudade agora.


Para Jampa, Glaucia e Kali

terça-feira, 11 de novembro de 2008

"Não deixe Marx morrer, não deixe Marx acabar"

O Post de João sobre a “Volta do defunto” e o de Bernardo Jurema sobre o Recife e suas mazelas, me fizeram refletir sobre o fato de como as questões do cotidiano estão intrinsecamente ligadas àquilo que estudamos e como nos posicionamos diante desse cotidiano. Academia, leituras, teóricos, egos inflados, vaidades de todas as idades e de diferentes Unidades Federativas só parecem acentuar e dificultar a compreensão das nossas experiências as mais corriqueiras. A contra postura, mesmo que inconscientemente, crítica que se instaura, parece limitar a visão daqueles que de tão enfurecidos com a situação atual se colocam em posições dicotômicas e excludentes. A perspectiva que parece imperar é a de uma visão que opta por uma perspectiva monista da vida em seus múltiplos aspectos. De acordo com esse ponto de vista as polarizações e falta de necessidade de se pensar mais aprofundadamente sobre algumas categorias analíticas impedem a percepção mais acurada daquilo que deu sustentação e foi de fato a gênese do processo de conhecimento, já que se deve partir da vida em suas diferentes configurações para que daí seja viabilizado o desnudamento e a compreensão da mesma.

Não deixemos que os “mortos” morram quando eles nos são demasiadamente úteis e nem percamos a certeza de que o nosso cotidiano grita por explicações e soluções.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Crise tira defunto da cova

No Hermeneuta (no post Mundo de loucos) encontramos a seguinte informação:

Crise aumenta procura por obras de Karl Marx na Alemanha

Editora vendeu em um mês nº de cópias de ‘O Capital’ que vendia em um ano.

- A atual crise financeira global parece estar aumentando a busca por obras de um dos maios conhecidos e ferozes críticos do capitalismo: o pai do comunismo, Karl Marx.

A editora alemã Karl Dietz, dedicada a livros de pensamento de esquerda disse já ter vendido, neste ano, 1,5 mil cópias da obra mais famosa de Marx, O Capital, escrita em 1867.Só no mês passado, foram vendidas 200 cópias, o mesmo número que, no passado, costumava ser vendido em um ano.

A Dietz não é a única editora a publicar obras de Marx, mas, segundo a imprensa alemã, lojas ao redor da Alemanha têm visto um aumento de 300% na venda do livro nos últimos meses.O correspondente da BBC David Bamford afirma que muitos vêem a atual crise como um fracasso do capitalismo e que a obra de Marx poderia ajudar a entender o que deu errado. Segundo Bamford, o número de visitantes a Trier, na Alemanha, cidade natal de Marx, subiu neste ano para 40 mil.

O curador do museu da cidade afirma que já perdeu as contas de quantos visitantes ele ouviu dizer que Marx estava, afinal, certo em suas críticas ao capitalismo.

Credo cruz, será que esse povo germânico estaria pensando nessas palavras e se dizendo "eu já li isso em algum lugar"?

“Em um sistema de produção onde toda a continuidade do processo de reprodução depende do crédito, quando este acaba subitamente e somente transações com dinheiro passam a ser aceitas, é inevitável que ocorra uma crise, uma tremenda demanda por meios de pagamento. É por isso que, à primeira vista, a crise inteira parece ser somente uma crise de crédito e de moeda. E de fato trata-se apenas da conversibilidade de letras de câmbio em dinheiro. No entanto, a maioria destes papéis representam compras e vendas reais, cuja extensão – para muito além das necessidades da sociedade – é, afinal, a base de toda a crise. Ao mesmo tempo, há uma quantidade enorme destas letras de câmbio que representam mera especulação, que agora revela sua face e colapsa; especulação fracassada com o capital de outras pessoas, com o capital-mercadoria depreciado ou invendável, ou com ganhos que nunca mais poderão ser realizados. Todo esse sistema artificial de expansão forçada do processo de reprodução evidentemente não pode ser resolvido com um banco, por exemplo, o Banco da Inglaterra, entregando a todos esses especuladores o capital que lhes falta através de seus títulos, comprando mercadorias depreciadas a seus antigos valores nominais. Aliás, é nesse momento que tudo começa a parecer distorcido, já que nesse mundo de papel, o preço real e seus fatores reais desaparecem, deixando visível somente metais, moedas, cédulas, letras de câmbio e títulos.” (Karl Marx, O Capital, vol. 3, cap. XXX.)

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

É bonito

Um Velho
(Konstantinos Kaváfis)

No fundo do café tão barulhento
curvado sobre a mesa pousa um velho
com um jornal em frente e sem companhia.

E na desgraça da velhice vergonhosa
pensa quão pouco desfrutou dos anos
que tinha força, e fala e beleza

Sabe que envelheceu muito: o vê e sempre o sente.
Embora o tempo que era jovem lhe parece
como ontem. Que distância pequena

E pensa, a razão como se enganava
e como a confiança sempre o louco
a mentirosa que dizia “Deixa, tens tempo ainda”.

Lembra os desejos que abnegava e o quanto
prazer sacrificava. A sua boba cuca
toda perdida oportunamente caçoa.

...Mas de pensar e de lembrar-se tanto
o velho ficou tonto. E adormeceu
na mesa do café se segurando.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Misoginia de blogue: de pessoa e/ou instituição

Adoro uma polêmica blogueira. Vamos a mais uma, e das boas.

Tentando fugir um pouco do meu último texto, que mencionou minha preocupação com o tipo de leitura que poderia ser feita do Pedagogia da punheta, eu concebo uma pequena reflexão sobre o machismo presente numa enquete sobre as musas das Olimpíadas de Pequim. A polêmica se encontra principalmente nos comentários e vai ser justamente a partir deles que irei discorrer algo a respeito.

Primeiro gostaria de me solidarizar com as opiniões da “ala feminista”. E aqui não falo de feminismo como o engraçadinho Ariston(comentários) que assim se referiu às mulheres que repudiaram com razão o texto e as fotos escolhidas para ironizar o propósito de seus argumentos. Para mim, heterossexual do sexo masculino, também é triste perceber que a misoginia (que não é a meu ver o pior de nossos males machistas, acho que a homofobia é bem mais horrenda e aceita) possa passar tão facilmente como algo natural e comum e, para fins hipocritamente cômicos, se passar por mera “brincadeira de mau gosto”.

Porém, no seu ridículo, o tal do Ariston coloca algo interessante e que deve ser pensado: “As PESSOAS de um modo geral (intelectualizadas ou não) têm seus gostos.” Uma tautologia barata, sem dúvida, mas que tem uma lógica social a ser pensada no que se diz sobre o machismo e a misoginia. Afinal de contas, quem tem direito de ser machista numa sociedade machista?

O problema levantado por Cynthia Hamilin não é propriamente da misoginia pura e simples, mas da posição institucional da mesma, o que é bem pior. Vejamos o que ela questiona: “É lamentável que um blog escrito por professores universitários reproduza este tipo de misoginia. As mulheres se saíram bem nas olimpíadas, “mas isso não importa” (que frase infeliz!): o que importa é que elas são “gostosas”. Já pararam para pensar que talvez essas mulheres prefiram ser reconhecidas como atletas que são?” A questão colocada por Hamilin é bem mais a de saber quem fala o que e o que está representado naquela fala, do que uma mera crítica a idiotice de um machista qualquer.

É claro que Pierre Lucena, cidadão sorridente e bem vestido, tem todo o direito de expressar suas opiniões sobre as qualidades que ele mais aprecia numa mulher (e não é preciso ir muito longe para entender que tipo de “visão de mulher” ele tem). Mas o problema é que Pierre Lucena fala enquanto professor da UFPE, que, se fosse instituição de respeito, pediria satisfação a respeito de opiniões expressadas publicamente tão desprovidas de valor\rigor\seriedade acadêmica, fato que coloca em jogo e em questão a própria instituição.

Volto à tautologia “as pessoas de um modo geral têm seus gostos” e ao importante adendo “intelectualizadas ou não”. Eu concordo plenamente com o argumento de Cynthia Hamilin ao mesmo tempo que reflito sobre o significado que a ruptura que ele pressupõe revela: o machismo estrutural que se desvela de maneira violenta nas maneiras de apreciar (a palavra mais apropriada seria depreciar) as mulheres exposta na enquête revela ao mesmo tempo a fragilidade da assimilação dos valores da mulher como ser humano pleno (pautados no feminismo ou além dele) no tecido social e o pouco respaldo que o debate contra a misoginia alcançou na estrutura de poder das relações universitárias. Nesse sentido, quero crer, o caso não é de feminismo pura e simplesmente, mas algo mais sério, no mínimo de denúncia de falta de decorro profissional onde alguém, em certo sentido, usando do status atribuído por uma instituição (Professor da UFPE), diz coisas não sensatas (adoro eufemismos) a respeito de seu modo de depreciar mulheres.

O machismo por parte de alguns docentes da UFPE. Indignada!

Ontem recebi um e-mail coletivo da Profa. Cynthia Hamlin. O teor da mensagem abordava o conteúdo de um blog formado por professores da UFPE, infelizmente.

Os digníssimos docentes tiveram a coragem de publicar um post sobre, "As musas das Olimpíadas". As proposições e comentários são os mais esdrúxulos possíveis e mostram como eles reproduzem práticas odiosamente machistas. O pior é que acham que estão absolutamente corretos.

Vou colocar o endereço desse blog que possui a pretensão de falar sobre política. Piada, não é?

http://acertodecontas.blog.br/esportes/musas-da-olimpada-a-minha-favorita/